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Bzz,
bzz
Ajeitei-me num pulo contra os cantos gelados do plástico
da banheira. A água já não estava mais morna como antes. Por
quanto tempo eu estava ali deitada? O celular vibrava na bancada da
pia, e me levantei respingando o piso ao redor da banheira. Estiquei
o braço para alcançar o celular, que no mesmo momento desistiu de
vibrar. Era Sara. Retornei a ligação na esperança dela não ter se
zangado.
“Eu estava tomando banho, não ouvi” me expliquei
“Tomando banho?” disse ela gritando “Você tem
noção do horário? Oh, muito típico vindo de você, Mariah. Em
vinte minutos eu estou passando na sua casa!”
Abri o pequeno ralo da banheira e me sequei o mais
rápido que pude. Meu vestido já estava em cima da cama, só faltava
arrumar o cabelo e me enfeitar um pouquinho, afinal eu merecia.
Deslizei num passe de mágica o vestido cinza, tomara-que-caia e
corri para frente do espelho. Ele ficou perfeito, como se tivesse
sido feito especialmente para mim. E olha que eu pexinxei na loja por
um bom tempo.
Calcei um salto preto herdado da minha mãe, – tinha
uma sorte e tanto por nós duas calçarmos o mesmo tamanho – já
que ela tinha um armário cheio deles, não iria fazer falta. Corri
cambaleando para a frente do espelho e passei um pouco do pó e do
rímel da coleção de maquiagens caríssimas que ela tinha. Outra
coisa que ela não daria falta.
Com certeza, bati o récorde em velocidade. Isso teria
levado duas horas ou mais, se fosse Sara que tivesse se atrasado.
Bzz,
bzz
Sim, sim. Acalme-se, eu já estou pronta – pensei.
Delizei o botão na tela do meu iPhone e não reconhecia
o número que apareceu nela. Não era o da Sara, nem o da mamãe.
Apoiei o celular no ombro esquerdo, enquanto escrevia em um pedaço
tortamente rasgado, um bilhete avisando que tinha saído.
“Alô?”
“Sara Eaton?” falou a voz rouca séria do outro lado
da linha. Era uma voz masculina, mas não consegui distinguir de quem
era.
“Sim... sou eu.”
“Sou Ben Stanley, médico do Hospital de Detroit. Você
teria, por acaso, alguma relação parentesca com uma mulher atendida
pelo nome de Emma Eaton?” hexitei ao responder, e por longos
segundos, a conversa ficou silenciosa e tensa.
Parei de escrever o bilhete, que já estava na metade, e
olhei profundamente para o nada.
“Ela é a minha mãe,” disse com a voz e mãos
trêmulas “por quê? O que houve com ela?” estava quase gritando
com o médico, quando lembrei de manter a calma. Ainda não sabia
sobre o que se tratava, então respirei fundo e me sentei na cama da
mamãe.
O médico demorou a responder. A ligação estava
falhando, mas não, não podia cair logo agora. Vamos, fale alguma
coisa.
“Oh, eu sinto
muito. O carro em que sua mãe dirigia, foi atingido por um caminhão
em alta velocidade.” disse ele num tom um pouco mais calmo, talvez
para passar uma sensação de conforto para mim. Como eu queria que
ele soubesse que aquilo não estava funcionando. “Eu suponho que as
crianças atendidas pelos nomes: Drake, Jared e Carlie eram seus
irmãos. Eles, infelizmente não sobreviveram ao impacto, e faleceram
na hora.”
Não. Não pode ser verdade. Se isso é algum tipo de
trote, o feitor pagará muito, mas muito caro.
“O estado da sua mãe era grave. Ela foi induzida à
coma, e temos alguns aparelhos que estão ajudando-a a respirar.”
Desliguei o celular. Não. Não poderia ter acontecido.
Como assim? Um dia eu estou dando um beijo na testa dela e saindo
pela porta para ir para a escola, e no outro ela simplesmente está
desabilitada, deitada numa cama com aparelhos ajudando-a respirar.
Não. Está tudo muito errado.
As lágrimas já estavam derramando sobre meu rosto,
borrando a maquiagem. Foda-se a maquiagem. Tirei os lindos saltos que
peguei do armário dela e fui correndo escada à baixo. Peguei as
chaves do meu carro e fui. Fui ao encontro quase inacreditável dela.
Minha mãe, meio viva, meio morta. Não. Eu me recuso a acreditar.
Saí porta a fora correndo com os pés afundando na neve da garagem.
Não sentia frio, apenas um vazio enorme se alastrando em mim.
O hospital ficava a alguns quilômetros de onde eu
morava – seis, no máximo – e o trânsito, felizmente, estava
coperando com a minha pressa. Via pelo retrovisor meus olhos pretos,
manchados pelo rímel. Meu nariz vermelho de tanto chorar.
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