Ela não atua nem quando está nua, não faz cena nem reproduz a mesma voz chata que fez às 02h.
Ela repete o refrão da música mais que o necessário, me lembra duas vezes a mesma coisa e sorri quando vê meu reflexo enquanto se olha no espelho. Chamo de morena quando sua expressão fica serena, chamo de meu bem quando se irrita na fila do cinema.
Ri de si mesma quando erra a palavra, dança quando fica sozinha em casa, faz pose antes de fazer graça. Caminha descalça e reclama que sujou o pé, fica de meia em casa. Ela é um caso perdido, uma peça quebrada de um quebra-cabeças. Ela é mais um mistério pra aqueles que tentam desvendar o universo. Minha menina galáxia não é elíptica, espiral ou irregular.
Ela é uma foto desfocada, sonho da noite passada, ontem no amanhã. Minha morena só pensa no futuro enquanto vive de no pretérito. Ela não consegue fazer nada que seja perfeito. Constrói enquanto destrói, afoga enquanto nada, morre sem pedir pra ser salva.
O papel na vida dela é ser sozinha, o papel dela na minha vida é ser só minha. Ela é meu jogo de palavras, um perfeito anagrama do qual nunca vou conseguir desistir. Eu canto, escrevo e componho. Ela lê, rasga e remenda o meu sonho. Mas eu perdoou quando vejo aquele sorriso, o sorriso que afasta e faz medo a solidão. Ela é a sombra que me protege do sol, minha capa na chuva, a neve no meu deserto. Ela é algo desconstruído que de alguma maneira ficou concreto. O que fez de quem isso uma coisa tão irrelevante?
Fica calada e não sei se está rezando pra tudo ficar bem ou se está pensando em mim. Suplico que pelo menos murmure algo na segunda pessoa do singular, que fale você quando quer falar de mim. Mas que fale no final da frase, logo depois de um "eu amo". Que tenha coragem pra ser depois de desfazer, que não deixe que mais ninguém deite na minha cama pra me aquecer e confortar.
Oro pra que seja minha nas noites em que jura estar sozinha, peço pra que os anjos a protejam porque ela não vive embaixo do meu céu, ela está num nevoeiro que a impede de ver que tudo que sinto é verdadeiro. Por isso ela faz o que quer de mim, brinca com meu coração. Morena não é um monstro, é uma menina que não aprendeu a ser mulher. Ela é alguém que não quer aprender a viver, uma pessoa muito crítica quanto ao seu jeito de ser. Ah, que desgraça, ela tem que parar de me olhar daquela maneira se não me tem de graça.
Rafaela Faria
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